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O Edifício

Depois de assimiladas todas as contingências como a relação do edifício com a estrada Óbidos-Caldas, os terrenos instáveis, as questões legais quanto à propriedade de terrenos e a tutela eclesiástica referente a qual das colegiadas tutelaria o Santuário, a obra avançou e foi inaugurada em 1747. A obra do Santuário do Senhor Jesus da Pedra inscreve-se num contexto barroco nacional, muito influenciado por valores transpirinaicos de uma primeira geração de arquitectos, sobretudo de gosto italiano, representados, em primeira linha, por Mafra, edifício que, aliás, esteve na base da formação de Rodrigo Franco. O Santuário do Senhor Jesus da Pedra insere-se neste segundo momento do Barroco em Portugal, que poderá ser compreendido entre o lançamento da primeira pedra do Palácio Real de Mafra (1717) e a morte de D. João V (1750). Sendo o Santuário uma obra produzida na maturidade do arquitecto Rodrigo Franco, ela resulta da experiência profissional desse homem, bem como dos seus valores e das necessidades da entidade contratadora. Paralelamente este templo revela-se uma das principais obras barrocas em território nacional, dado a extravagância das suas plantas e alçados e por ser, genuinamente uma obra portuguesa (feita por arquitectos e mestres portugueses). Funcionando como ex- -líbris do edifício, temos as invulgares janelas repetidas e forma invertida, sendo a mais expressiva a do janelão grande da fachada. Além deste tipo de janelas em forma invertida, outras existem também muito características desse período, em forma oval ou rectangular, bem marcadas pelas cantarias e pelos frontões. Só por si, o conjunto do portal e janelão da fachada, ou o conjunto da porta e da janela da sacristia, são composições de grande plasticidade e elegância, exercícios perfeitos de arquitectura e sinais pungentes da verticalidade estabelecida no conjunto do edifício. Se à primeira vista o edifício nos parece esmagador, quando tomamos em consideração a possível conclusão das torres, obtemos de imediato outra imagem, toda ela inspirando verticalidade e conduzindo as alterações para o alto. A fenestração que se rasga para o interior do templo integra-se neste espírito de elevação e de iluminação. As portas laterais, que abrem para os altares colaterais do templo, encontram-se protegidas por um vestíbulo e apresentam-se sobrepujadas de um tímpano. Este tipo de remate e decoração da cantaria em tímpano, influenciou a reconstrução pós-terramoto da igreja de São Tiago, nomeadamente na face interior, mais elaborada, das quatro janelas laterais do templo (duas delas na capela-mor), bem como na estrutura do pórtico, embora um pouco mais simples.

D. JOÃO V E D. TOMÁS DE ALMEIDA
Aliando os recursos disponíveis a uma forma absoluta e pessoal de conduzir o poder, D. João V demarcou a posição de Portugal na Europa, absorvendo dela as correntes de vanguarda, sobretudo o barroco (de matriz romana), projectando-as política e culturalmente, embora de uma forma um tanto esporádica. A economia interna, embora dependendo dos fluxos auríferos e de pedras preciosas do Brasil, regista alguma expansão, incrementando-se a produção de vinho, de azeite e de cereais, bem como a instalação de novas culturas (como a batata e o milho). Também a pecuária e a pastorícia se desenvolvem, quer para o consumo de carne, quer pelo aproveitamento da pele ou lã. Com este incremento inicia-se uma produção industrial que, embora ainda de reduzidas dimensões, ultrapassa já a escala familiar de autoconsumo. Enquadrada pelas novas condições financeiras a arquitectura e as artes são também objecto de aquisição. Por todo o País são erguidos novos palácios (solares), igrejas e outras casas religiosas, para as quais se destinava a maior parte da produção artística. A nível social também existem transformações com a extinção e a criação de novos títulos nobiliárquicos. No clero, dá-se uma dignificação do alto clero, com a elevação do capelão-mor da Casa Real a Patriarca e, mais tarde, à dignidade cardinalícia. A cúria patriarcal de D. Tomás de Almeida apresentavase rodeada de um esplendor em muito semelhante ao do Papa. Esta posição não só reforçava o poder da Igreja como do próprio Estado. O poder da Igreja durante os séculos XVII e XVIII é enorme, verdadeiramente um Estado dentro do Estado, com legislação, hierarquias e tribunais próprios, respondendo em obediência a uma legitimidade supranacional: o Papa. Coroa e Igreja são indissociáveis, sobretudo após o concílio tridentino cujas normas foram, integralmente aceites por Portugal. O Estado e a Igreja articulavam a sua acção de forma mutualista, embora tecnicamente coubesse ao Estado a última palavra em diversas matérias. Com o período joanino, a Igreja não perde terreno, mas o Estado ganha maior desempenho e revela a sua posição de forma mais determinada.

 

CAPITÃO RODRIGO FRANCO Arquitecto de vasta formação, em virtude do seu trabalho para as ordens militares, Priorado do Crato e Ordem de Malta. Executou obras de natureza religiosa, para além do Santuário do Senhor Jesus da Pedra, na torre sineira da capela de Nossa Senhora de Monserrate, pontualmente na Igreja da Misericórdia (ambos em Óbidos), capela-mor da igreja Matriz de Casa Branca (Sousel). Exerceu ainda a sua função no domínio da arquitectura civil, em Santo Antão do Tojal e Xabregas, e na engenharia hidráulica ao participar como adjunto de Custódio Vieira, no Aqueduto das Águas Livres em Lisboa. Chegou a dirigir os trabalhos entre 1744 e 1745. Terá sido encaminhado para Mafra cerca de 1725 onde frequentou a Aula do Risco, aí conhecendo o arquitecto e ourives Carlos Mardel. Mafra possui um enorme peso na estética defendida e concebida por Rodrigo Franco, patentes no Senhor Jesus da Pedra, por exemplo no desenho de alguns vãos (janelas e tribunas) e das próprias estruturas retabulares. Outra das suas influências poderá ter sido o italiano Canevari, que lhe permitiu aperfeiçoar o estilo ao gosto romano da época, tendo como indicador as semelhanças entre a torre que projectou para o Santuário e a torre do Palácio Real (destruída pelo sismo de 1755), que seria da autoria do arquitecto italiano. Considerando o conjunto dos arquitectos do período e da geração de Rodrigo Franco, e relativizando, face à escassez evidente de estudos, podemos entender que este arquitecto foi, ao seu tempo, um dos mais bem sucedidos. O Santuário do Senhor de Jesus da Pedra é a sua obra de síntese de todos esses conhecimentos e o expoente de uma carreira, marcando o Barroco (ou neoclassismo barroco) nacional. Nesta obra revela domínio técnico dos limites dos materiais (estruturas construtivas ou limitações financeiras), mas também veia criativa, inovando e trazendo novos valores culturais.

 

Contactos

morada Santuário Nossa Senhora da Pedra, Óbidos

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