O Santuário Senhor Jesus da Pedra e o culto que lhe é inerente é dos mais curiosos e interessantes da Estremadura. Começando pela própria imagem do Senhor Jesus da Pedra, misteriosa nas suas origens e enigmática nas formas de representação de Cristo crucificado. Rudimentar, ancestral, ou ambas as coisas, não têm sido muitos os investigadores que se aventuram a propor uma datação. Difícil de enquadrar em sistemas comparativos, tão frequentes em História da Arte e sem referências documentais que testemunhem a sua criação, resta um ou outro testemunho, de séculos mais recentes, em que o culto e a imagem já são referidos. A proporção do Cristo crucificado, o movimento contorcionista e a representação anatómica quase metafórica fazem desta imagem um enigma sem resolução aparente, pelo menos, nos tempos mais próximos.
A obra do Santuário do Senhor Jesus da Pedra inscreve-se num contexto barroco nacional, muito influenciado por valores transpirinaicos de uma primeira geração de arquitectos, sobretudo de gosto italiano, representados, em primeira linha, por Mafra, edifício que, aliás, esteve na base da formação de Rodrigo Franco.
O Santuário do Senhor Jesus da Pedra inscreve-se neste segundo momento do Barroco em Portugal, que poderá ser compreendido entre o lançamento da primeira pedra do Palácio Real de Mafra (1717) e a morte de D. João V (1750).
Sendo o Santuário uma obra produzida na maturidade do arquitecto Rodrigo Franco, ela resulta da experiência profissional desse homem, bem como dos seus valores e das necessidades da entidade contratadora. Paralelamente este templo revela-se uma das principais obras barrocas em território nacional, dado a extravagância das suas plantas e alçados e por ser, genuinamente uma obra portuguesa (feita por arquitectos e mestres portugueses).
Funcionando como ex-líbris do edifício, temos as invulgares janelas repetidas e forma invertida, sendo a mais expressiva a do janelão grande da fachada.
Além deste tipo de janelas em forma invertida, outras existem também muito características desse período, em forma oval ou rectangular, bem marcadas pelas cantarias e pelos frontões.
Só por si, o conjunto do portal e janelão da fachada, ou o conjunto da porta e da janela da sacristia, são composições de grande plasticidade e elegância, exercícios perfeitos de arquitectura e sinais pungentes da verticalidade estabelecida no conjunto do edifício
Se à primeira vista, o edifício nos parece esmagador, quando tomamos em consideração a possível conclusão das torres, obtemos de imediato outra imagem, toda ela inspirando verticalidade e conduzindo as alterações para o alto. A fenestração que se rasga para o interior do templo integra-se neste espírito de elevação e de iluminação.
As portas laterais, que abrem para os altares colaterais do templo, encontram-se protegidas por um vestíbulo e apresentam-se sobrepujadas de um tímpano.
Este tipo de remate e decoração da cantaria em tímpano, influenciou a reconstrução pós-terramoto da igreja de São Tiago, nomeadamente na face interior, mais elaborada, das quatro janelas laterais do templo (duas delas na capela-mor), bem como na estrutura do pórtico, embora um pouco mais simples.
Será uma imagem paleocristã ou um antigo cruzeiro à saída da localidade, muito comum nos séculos XVII/XVIII? O carácter lendário continua nas diferentes versões sobre como foi encontrada esta imagem. Seria parte integrante de uma capela, pois existem registos de procissões, como a das Ladainhas (anterior à festividade da Ascensão de Cristo), que entrou em abandono, provavelmente devido à sua distância face à vila. Mais uma vez a lenda ramifica-se e a história é substituída. Terá sido um agricultor quem escutou uma voz entre um silvado dizendo que não iria chover se não se venerasse condignamente a imagem ou teria sido revelada por um sonho a um homem que intercedia por outro que estava prestes a ser injustiçado?
Sabemos que a primeira hipótese, ainda hoje, é a mais aventada. Sabemos também que o culto ao Senhor da Pedra sempre esteve profundamente ligado à intercessão divina contra as doenças e os maus anos agrícolas. A imagem foi descoberta num combro de 2,80 m de altura, em terra da Colegiada de Santa Maria de Óbidos, nas ruínas de uma antiga capela localizada junto à estrada para Caldas da Rainha.
A vila de Óbidos, ao tomar conhecimento da descoberta, organizou uma procissão que partiu do oratório de Nossa Senhora da Graça até ao local. Aí rezaram e dirigiram-se, novamente em procissão, para a igreja de Nossa Senhora do Carmo. O período de seca que a região atravessava foi, pouco tempo depois, interrompido pela chuva copiosa que permitiu um ano de boas colheitas. O Santuário passou a ser um local de peregrinações e romagem de círios e em 1762 foi instituída a feira de Santa Cruz, com o seu dia principal a 3 de Maio.